“Meu caminho é a arte” é a frase que guia o curta Primavera Preta, do cineasta Antonio Santos, que foi o grande vencedor da II Mostra de Cinema Preto Periférico, realizado em Ouro Preto entre os dias 21 a 26 de outubro. O filme pernambucano aborda de maneira sensível e autêntica as vivências periféricas e negras. Com isso, a película ganhou a primeira edição do prêmio Marku Ribas, criado neste ano para celebrar a carreira do artista que o nomeia e os filmes que abordam os temas centrais da MCPP. A menção honrosa deste ano foi o curta ““Os sonhos guiam” da cineasta Nathalia Tupi de São Paulo.
Com o ator Renato Novaes como grande homenageado, ao todo, a mostra recebeu mais de 140 inscrições de filmes de todo o país. A seleção oficial do evento contou com 12 filmes, com 5 escolhidos para a seção especial. Ao todo, realizações sobre o cotidiano periférico das grandes cidades, filmes sobre ocupações, filmes quilombolas, filmes produzidos por cineastas LGBTQIA + e filmes produzidos por cineastas de origem indigena compuseram o certame oficial.
O Filme Primavera Preta
Com imagens que mostram o cotidiano das pessoas pretas, o curta demonstra sua força através da narração, que navega pelos sentimentos que essa comunidade enfrenta desde muito jovem, mas que há de florescer perante à tudo.
“Alguma vez eu já me senti amada (o)?”
diz uma das frases potentes do filme.
Os frames do filme impressionam pelo caráter singelo e potente do cotidiano. Além disso, a música também é importante personagem da trama, conduzindo as imagens e as frases. Concomitantemente a isso, são expostas cenas produzidas de uma tela preta, outros personagens vestidos e muitos rostos negros.
“A equipe do filme é motivo de orgulho para o evento, trazendo uma obra que representa a diversidade e a potência do cinema independente no Brasil”, disse o júri que escolheu o vencedor.
O filme termina na casa de um artista, que sonha em florescer através da sua música. Sua namorada chega e anuncia mais um florescimento através da Primavera que há de chegar: uma nova vida.
Os sonhos guiam
O filme que levou a menção honrosa carrega a força dos povos nativos brasileiros. Através de uma sensível abordagem, a realizadora Nathalia Tupi passeia experiências espirituais e sensoriais do jovem líder indígena Mateus Wera, morador da Terra Indígena Jaraguá, em São Paulo. Os sonhos compartilhados são a conexão entre ele e o irmão, Karaí Poty, e entrelaçam os caminhos da vida do cacique nas lutas atuais do seu povo.
Como diz a sinopse, “para o Povo Guarani Mbya, os sonhos são como se fossem portais para tudo aquilo que não vivemos no mundo físico… são como uma raiz de árvore que se conecta com a Terra. Eles nos permitem ver pessoas que não vemos mais nesse plano ou interagir com algo que se queria muito na vida”.
“O júri reconheceu a qualidade poética e sensível do filme Os Sonhos Guiam, concedendo-lhe uma menção honrosa muito disputada. A produção foi elogiada pela profundidade e beleza com que retrata a vivência onírica de uma das populações mais periféricas do Brasil“, destacaram os especialistas.
Criação do prêmio Marku Ribas: um marco para a Mostra de Cinema Preto Periférico de Ouro Preto
O grande idealizador do evento é Ben Hur Nogueira, cineasta morador de Ouro Preto que teve a ideia de criar uma Mostra de Cinema com uma temática muito cara para sua própria vida. Nesse sentido, em entrevista para o Geraes, Nogueira destacou o impacto significativo da edição deste ano, que homenageou o legado do artista Marku Ribas e de Renato Novaes. Para Ben Hur, a mostra foi um marco na valorização desses artistas, com exibições especiais de curtas e filmes que celebram suas contribuições culturais.
“Eu acho que foi um grande passo que a gente deu esse ano. Eu me sinto muito representado por essa mostra. Eu sinto que, cada dia mais, eu e a mostra, nós estamos amadurecendo, e sinto que a mostra cresce cada vez mais, exponencialmente, como se ela estivesse ganhando vida própria“, disse Ben Hur ao Geraes.
Para ele, esse prêmio ressignifica quem são os verdadeiros heróis da comunidade negra, valorizando ícones como Vander Lee, Luiz Melodia, Itamar Assumpção, Grande Otelo e o próprio Marku Ribas, em oposição a figuras de poder opressivas do passado.
Não são comerciantes escravos, não são coronéis, não são ditadores; são pessoas que buscaram salvar o Brasil de um determinado modo, buscar salvar suas comunidades, sabe?, finalizou Ben Hur.
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Jornalista formado pela Universidade Federal de Ouro Preto, com passagens por Esporte News Mundo, Blog 4-3-3 e Agência Primaz.