Com o bloqueio de R$ 366 bilhões do orçamento das universidades e dos institutos federais, a Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP) chegou a R$ 7,8 milhões em cortes orçamentários. Na quarta-feira (7), o Conselho Superior de Graduação (CONGRAD) da UFOP se reuniu e expôs a situação crítica da universidade, não tendo condições de pagar serviços e ações referentes a novembro. Portanto, os alunos não vão receber bolsa em dezembro, tanto os que recebem auxílio estudantil, quanto bolsas acadêmicas de mestrado, doutorado, iniciação científica, extensão, monitoria, Bolsas de Desenvolvimento Institucional (BDI), dentre outras.
A UFOP também não conseguirá arcar com medições de contrato para manutenção dos restaurantes universitários, compra de insumos básicos para ensino, pesquisa e extensão, contratos de serviços em geral e de manutenção de veículos. Processos licitatórios recém-concluídos pela instituição não poderão ser contratados, além de não ser possível realizar qualquer despesa emergencial.
“A situação é gravíssima. Antes da reunião, eu estava extremamente preocupada, porque não temos como pagar os nossos bolsistas, pagar os terceirizados e fazer as nossas atividades acadêmicas. É muito preocupante. Lá em Brasília, estão reunidos os reitores na Andifes (Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior) para tentar fazer alguma articulação, principalmente com os deputados e os parlamentares de uma forma geral e tentar reverter a situação. Neste cenário, é complicado conduzir reunião, aula e atividades acadêmicas, porque a preocupação nossa é integral da instituição e do funcionamento dela. É muito triste ver o que este governo está fazendo não só com a educação, mas principalmente com ela, com a saúde, ter um desmonte desse tamanho. Esperamos que a gente consiga reverter alguma coisa para que as pessoas que estão ao nosso redor não fiquem tão prejudicadas com essa situação”, declarou a Pró-Reitora de Graduação da UFOP, Tania Rossi Garbin.
O corte nas bolsas, como do Programa de Bolsas de Iniciação à Docência (PIBID) e de residência significa um corte no cotidiano e na vida das pessoas, pois o dinheiro advindo desses programas é o que as mantém dentro da universidade. Faltando 23 dias para encerrar o ano, grande parcela da comunidade acadêmica da UFOP não receberá o valor referente ao que trabalhou em novembro.
“É um desrespeito com as pessoas a tamanha falta de preocupação que esse governo tem com a sociedade. As pessoas que estão na universidade precisam pagar contas, comer e viver. Não ter isso neste mês é muito sério, é desolador. Eu estou me sentindo muito mal, triste e realmente muito chateada fazendo esse papel neste momento. Só a partir de pressão que vamos conseguir reverter um pouquinho desse grave estado que se encontra o país, hoje”, continuou Tania.
Terceirizados
Sobre os funcionários terceirizados da UFOP, Tania disse que também não há recurso para pagar, o que ressalta que o corte orçamentário das universidades não se trata de um problema de sala de aula apenas e sim uma questão social.
“O que acontece é que simplesmente existe uma conta pública e ela foi zerada, então não existe a possibilidade de haver movimentação financeira. O que acontece com as empresas terceirizadas é o repasse no início do mês e isso não foi possível de ser feito. Os nossos estudantes que vivem em função das bolsas de carência não vão receber. Neste momento, a universidade está zerada em termos de recurso financeiro, não tem como movimentar. Talvez, os estudantes não tenham como ficar na universidade. Nós não temos nenhum dinheiro, eles tiraram todo o recurso do mês de dezembro, não existe recurso”, disse a Pró-Reitora de Graduação da UFOP.
Ainda de acordo com Tania, não haverá, na UFOP, extensão curricular, porque não há combustível, não tem como pagar motorista e não haverá carro levando alguém da comunidade estudantil de Ouro Preto para Mariana. “Tudo sai do mesmo recurso e não tendo ele, não tem como fazer essas atividades do nosso cotidiano”, finalizou.
Sugestões
No decorrer da reunião, alguns professores se pronunciaram, dando sugestões de ações dos docentes para tentar combater os cortes drásticos que a UFOP e as demais universidades e os institutos federais sofreram.
“Eu acho que precisava fazer um movimento mais forte. Estou recebendo muitas mensagens dos meus alunos, principalmente dos que recebem bolsa permanência que não têm como ficar na UFOP, que terão que ir para a cidade dos pais. Como será o funcionamento da universidade sem a presença desses alunos? A situação é muito mais grave do que a gente pensa. Tem que ter uma movimentação bem grande para agora para podermos cessar com esse descaso com a universidade pública”, declarou a professora de Química Licenciatura, Ana Carolina Gomes Miranda.
O professor de Direito Internacional da UFOP, José Luiz Singi Albuquerque, acredita que o corte por parte do Governo Federal foi uma resposta à comunidade acadêmica, após a decisão das eleições presidenciais, e que os docentes precisam reverter a locação dos recursos que foram retirados das universidades. “Eu fico muito preocupado com a nossa situação e com as nossas possibilidades de reação. Penso que, nesse contexto, a tradicional utilização de notas ou manifestações parece pouca utilidade neste momento. Talvez, se a gente pudesse fazer algo mais proativo no sentido de identificar, dentro das decisões orçamentárias desse governo desgraçado que está acabando, felizmente. Se não encontramos maneiras de reverter a locação de recursos. O dinheiro existe, ele foi alocado para outras fontes que não somos nós, mas ele existe. Fomos preteridos, porque sabiam em quem iríamos votar e acho que essa punição é típica de quem não sabe perder”, declarou.
O professor Adjunto e Coordenador do curso de Administração da UFOP, Fábio Viana Moura, sugeriu que a universidade preparasse um documento dimensionando os impactos do corte orçamentário no ponto de vista quantitativo de terceirizados que não vão receber e estudantes de vulnerabilidade social que poderão ter seu processo de formação interrompido. “Como a universidade tem todos esses dados, seria interessante mostrar o desdobramento e as consequências desse comportamento escrupuloso desse governo, que age sempre dessa forma mesmo, para divulgarmos isso na mídia e levar isso para as prefeituras, porque há um impacto não só para a universidade, mas para uma porção de desdobramentos que esse corte vai provocar na região”, disse.
A vice-coordenadora do curso de Licenciatura em Ciências Biológicas da UFOP, Uyra dos Santos Zama, concordou com Fábio Viana e sugeriu que em uma possível manifestação, fosse pedido cestas básicas para os terceirizados, cesta de natal e comida para os alunos, a fim de que a população esteja ciente do que realmente está acontecendo na universidade. Como exemplo, ela comparou o impacto que Ouro Preto sentiu quando a fábrica de alumina, Novellis, anunciou o fechamento das portas e agora, com o corte orçamentário da instituição de ensino superior.
“Quando produzimos nota, a gente quase que fala para nós mesmos, temos um alcance muito limitado. Nossa mobilização precisa ser um pouco maior do que isso. Eu penso que a nossa manifestação, talvez, tenha que falar das peessoas. Vamos fazer uma manifestação pedindo cesta básica para os terceirizados, cesta de natal e comida para os alunos. Talvez, uma manifestação que mostre o problema humanitário que se causa um corte desse. Por mais que a gente fale de corte de verbas há muito tempo e falamos durante esse desgoverno inteiro, a gente ainda não parou, sempre damos um jeito, parece que nada muda. Quando a Novellis fechou as portas, Ouro Preto entendeu que tinha gente desempregada. Quando a gente fala que houve corte de verba na universidade, Ouro Preto não entende que tem gente que vai ficar sem o dinheiro do mês que vem”, opinou.
Por fim, a professora do curso de Serviço Social, Alessandra Ribeiro de Souza, manifestou seu posicionamento no sentido de paralisar as aulas, já que muitos alunos irão estudar sem saber se terão condições de arcar com a alimentação e o custo de vida deles em Ouro Preto e em Mariana. “O calendário está apertado, todo mundo teve que cumprir com seus planos de ensino, está muito difícil darmos conta do conteúdo com esses recessos e Copa, mas eu não consigo entrar dentro de sala de aula como se nada tivesse acontecendo, com os meus alunos desesperados. Acho que deveríamos ter uma deliberação de todas as universidades desse país para pararem suas ações e aí sim a gente vai para a rua, podemos levar as informações em cartazes e em greves. Se ele não recuar, como vamos entrar dentro de sala e ficar dando aula? Os alunos não sabem sequer se vão conseguir se manter na cidade, a maioria dos nossos alunos não é daqui, eles não vão conseguir comer, daqui a pouco não tem assistência estudantil e não tem nada”, disse.
Tania Rossi salientou que nenhuma decisão pode ser deliberada dentro do conselho de graduação e sim no de administração ou no Conselho Universitário (CUNI). A reitora da UFOP, Cláudia Marliére, está em Brasília tentando encontrar meios de reverter a situação junto de deputados e tudo o que foi passado na reunião do CONGRAD de quarta-feira será repassado à reitora.
Na quarta-feira (7), a UFOP postou uma nota detalhando os impactos do bloqueio neste mês de dezembro, já que não serão disponibilizados recursos. Confira o pronunciamento completo clicando aqui.
Jornalista graduado pela Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP), tendo passagens pelo Mais Minas, Agência Primaz e Estado de Minas.